24 de fevereiro de 2010

AJTG 2000-2010

Este ano cumprem-se 10 anos que desenho o cartaz anual da Associação de Jogos Tradicionais da Guarda. A AJTG foi uma parte importante do meu crescimento na Guarda, mas só comecei a desenhar cartazes para eles quando fui viver para o Porto, e depois por aí afora.
Os cartazes têm a particularidade estranha de terem de ter um grande espaço em branco central, em que depois são "coladas" as letras para cada actividade, pela própria AJTG. Depois são distribuídos pelas aldeias e locais onde se realizam as actividades. A juntar à festa, têm de ter 2 cores: uma para os jogos distritais e outra para os concelhios (ou outra coisa do género...). Por razões de espaço só vou colocar uma das versões de cada.
Estes cartazes são quase sempre feitos duma vez só, sem grande pesquisa ou conceito, mas todos juntos mostram várias obsessões por que fui passando, primeiro ao longo da faculdade no Porto, depois em Roma, Londres, Roma outra vez e finalmente Nova Iorque.
Aqui vai o primeiro:

16 de fevereiro de 2010

As obras e as rendas, parte 2

Enquanto esperávamos pela aprovação dos subsídios do RECRIA e empréstimos, a casa foi ficando em pior estado. O processo começou a durar mais do que esperávamos, veio o Inverno, choveu, e o telhado cada vez mais podre. A senhora mudou de atitude: não queria obras. A Câmara realojava-a durante as obras futuras, mas segundo ela "num bairro de pretos e ciganos". Não queria. Fechou-se e não saía por nada. A última vez que entrei na casa antes disso, reparei que ela vivia entre uma das oito divisões e a cozinha. O resto tinha água a entrar como na rua. Mas ela insistia: "Não se preocupe, cai-me um bocado de tecto na cabeça, eu morro aqui e depois pode fazer as obras que quiser". Entretanto, ninguém no RECRIA ou na Câmara nos sabia o que dizer - devia haver milhares de casos semelhantes, mas nenhuma maneira de resolver este. O processo continuava a avançar, ela continuava a não querer, e a casa continuava a cair.
Como nunca mais tínhamos notícias da Câmara, arranjei um empreiteiro para entretanto ir remendar o telhado. Através da enteada da D. Juventina, conseguimos marcar um dia para ir lá. Apareço eu, o empreiteiro e a enteada. Estamos os três na rua, e a senhora nem chus nem bus. Finalmente aparece à janela. "Não entra cá ninguém, não faz obras e etc." As pombas vigiavam por cima, empoleiradas na platibanda. Durante dez minutos, tentei explicar-lhe mais uma vez que a a casa estava a cair e que era só o telhado, não tem que sair de casa, isto da rua para a janela do primeiro andar. Ela não saía de casa. Passados dez minutos, a tampa saltou: SAIA JÁ DAÍ QUE EU ESTOU A QUERER FAZER OBRAS E A SENHORA ESTÁ-ME A DEIXAR CAIR A CASA (com uma ou outra obscenidade pelo meio). Foi a festa da vizinhança. De repente, toda a gente tinha uma opinião e histórias para partilhar sobre a senhora: as vizinhas da ilha atrás, os homens da garagem, o correio, o polícia em dia de folga. A opinião geral não lhe era muito favorável.
Entretanto chegou a polícia a sério, que eu tinha chamado. Saem dois agentes, grandes, e o chefe, de nariz vermelho, ouve a explicação que eu já tinha repetido ad nauseam: a casa está a cair, ela não quer obras, ainda me morre e depois quem é responsável sou eu. Vai daí falar com ela: "Dona Juventina, é a polícia, queria falar consigo". Nada. Então o chefe abre a tampa da caixa do correio, na porta de entrada, e grita lá para dentro "Dona Juventina, é a polícia". Ouvem-se passos. À décima tentativa, comunicada através da portinhola do correio, ela abre a porta. "Esse aí é um gordo!!!!" diz, apontando para o empreiteiro que estava atrás de mim. Finalmente, os polícias falam com ela e passam-me um auto, notificação, certificado qualquer que diz que a inquilina se recusa a fazer obras e passa a estar à sua responsabilidade. Mas continua a chover.



chovia lá dentro como na rua, adeus caros estuques

10 de fevereiro de 2010

À espera da tempestade

Que não se vê nos radares. Mas as ruas já estão cheias de sal, e os meus colegas já sabem a roupa e as botas que hão-de usar amanhã. Não é só em Portugal que há pessoas obcecadas pelo tempo.

4 de fevereiro de 2010

Obrigado governo

O dólar está cada vez mais alto, e parece que é graças a nós:

http://us.mobile.reuters.com/mobile/m/AnyArticle/p.rdt?URL=http://www.reuters.com/article/idUSN0349170820100203

Pode ser que finalmente valham a pena as minhas poupanças!

2 de fevereiro de 2010

Depois de um dia nas obras

A ler o excelente arrigo do José Teixeira no Café Mondego:

http://cafe-mondego.blogspot.com/2010/01/balanxo-2009-ultimo-jose-teixeira.html

Enquanto me preparo para a minha última obsessão: os episódios do Twin Peaks, grátis online:

http://www.cbs.com/classics/twin_peaks/

E entretanto ouvir na rádio analógica os flaming fire:

http://www.myspace.com/flamingfire

Que belo serão!

1 de fevereiro de 2010

As obras e as rendas, parte 1

[Os pombos e gaivotas também eram inquilinos]

Tive até há tempos uma inquilina. A Dona Juventina, que não era flor que se cheirasse. Não deixou descendência nem saudade e morreu, imagino que tristemente, num lar. Apesar de a ter conhecido bastante tarde (ela era inquilina do meu avô) e ela me ter enfernizado a vida o quanto pôde, tenho uma réstia de pena por isso. E no meio de toda a história da minha casa nova, ela é apenas uma parte da novela, da insanidade que foi todo o processo. No fim de contas, simplesmente fez o que se esperava de um inquilino idoso e sozinho com poucos rendimentos: fechou-se com unhas e dentes em casa, e deixou-a cair aos poucos (além de alimentar pombas aos milhares).
A história começa quando o meu avô emigrou para o Brasil, há várias décadas (penso que por problemas com o regime). Alugou a casa onde tinha crescido com a família, e onde vivia na altura com a minha mãe e a minha avó, e foi para o Rio de Janeiro. Voltou nem passado um ano, mas entretanto tinha alugado a casa, e por isso teve de alugar outra para ele, na Boavista.
A família que lhe tinha alugado a casa originalmente, penso que nos anos sessenta, cresceu e foi saindo. O patriarca ficou e antes de morrer casou com a empregada - a Dona Juventina, que acabou por lá viver até aos 90 e poucos.
E assim, durante anos a fio, os meus avós pagavam uma renda baixíssima, e recebiam outra ainda mais baixa, por uma casa três vezes maior. Claro está, nenhuma obra foi alguma vez feita, nem por eles, nem pela senhora, em nenhuma das casas (isto também não é novidade para ninguém que viva em Portugal).
Anos mais tarde, eu e o meu irmão herdámos a casa, com a inquilina lá dentro. Lembro-me de, de vez em quando, receber umas chamadas em que ela protestava: entra-me água dentro de casa, isto o tempo anda muito mau, têm de fazer obras. E nós: com 40 euros de renda vitalícia não dá para fazer grande coisa, tenha paciência. Mal sabíamos.
Eventualmente descobrimos que havia programas que financiavam a recuperação de casas no centro histórico. Bestial, vamos avançar com isso. A casa recupera-se, a inquilina paga uma renda actualizada, e a segurança social subsidia-lhe a mesma. Além disso dão-lhe uma casa temporária para ela estar enquanto as obras durarem. It's a win-win situation.


Mal sabíamos.